Depois de anos, resolvi finalmente voltar a fazer sessões de terapia. Todos precisamos de um suporte psicológico… A vida é complexa. Nós somos complexos. As nossas relações são complexas. Nada melhor de que um olhar treinado, imparcial e profissional para nos ajudar a entender e incorporar melhor os vários papéis que desempenhamos diariamente (mãe, esposa, filha, irmã, amiga…).
Assim, estou sentada na poltrona em frente à terapeuta para uma primeira sessão. Ela ouve-me, questiona-me, contesta-me, acolhe-me e diz que vamos ter de voltar no tempo para entender muitas das minhas ações atuais. Muitas delas estão ligadas, claro, à minha infância…
Nesse preciso momento sinto um frio subir pela espinha, e penso na enorme responsabilidade que nós, mães e pais, temos em relação aos nossos filhos.
Leia também: «Um neto é a extensão de um filho»
É principalmente na infância que o caráter começa a ser moldado. Muitas ações e reações que os nossos filhos terão ao longo da vida serão reflexo de vivências do passado, num período em que estávamos no comando.
Claro, seria muito simplista atribuir a culpa de todos os defeitos que temos aos erros dos nossos pais. Mães e pais erram, mas erram ao tentar acertar. Talvez uma zanga tenha sido mais exacerbada, um tom de voz tenha sido mais alto e enérgico que o necessário, mas somos todos humanos e sujeitos a falhas, às vezes voluntárias, às vezes involuntárias. É inevitável que nossos filhos sejam o reflexo dos nossos erros, assim como também o são dos nossos acertos.
Se eu pudesse retratar num desenho a cena que descrevo, haveria, certamente, um peso gigante na minha cabeça. O peso da responsabilidade. O peso da culpa. O peso da preocupação.
Quantos «não te sujes» que eu tenha dito poderão tornar as minhas filhas maníacas das limpezas? Quantos «fala mais baixo» poderão tornar as minhas filhas tímidas e inseguras? Quantos «com quem é que pensas que estás a falar» poderão fazer com que minhas filhas sejam mães autoritárias? Quantos «mãe, tu não me estás a prestar atenção» – enquanto vejo uma última mensagem no telemóvel -, se voltarão contra mim? Quantas falas e atitudes minhas reverberarão no inconsciente das minhas meninas para todo o sempre?
Leia ainda: «Sou tua mãe, não sou tua amiga. Respeito é bom e eu gosto!»
Na minha cabeça rondam perguntas e mais perguntas. E medo. Muito medo. Medo de errar como mãe.
Ao mesmo tempo, enquanto a terapeuta finaliza a sessão, olho para o lado, e reconheço as minhas angústias, dúvidas e incertezas deitadas ao chão. Estou mais aliviada. Só consigo pensar que foi certeira a decisão de procurar a minha interlocutora, que agora olha para mim por entre os óculos de aro redondo, ao mesmo tempo que diz um «até para a semana que vem». Só consigo pensar que esse rosto me será muito familiar pelos próximos meses, e talvez anos. Só consigo pensar que estou a começar a trilhar o caminho certo para o autoconhecimento e para o enriquecimento e equilíbrio das minhas relações interpessoais.
E lá mais à frente, quando as minhas meninas se tornarem grandes mulheres (porque eu sei que o serão!), que reconhecerei muito de mim nelas.
Não é à toa que ser mãe é reviver a própria vida, mas no corpo e alma de alguém que saiu de dentro de nós. Há muito de nós nos nossos filhos. Que seja sempre a melhor parte…
Texto: Marcella Bisetto, mãe, advogada e escritora apaixonada
Blogue
Autora do livro (disponível nas lojas Amazon, em versão digital, no mundo inteiro)