Saúde

Conheça duas mulheres que, devido ao cancro, se depararam com a menopausa precoce

Redação
publicado há 5 anos
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18 de outubro é o Dia Mundial da Menopausa. Outubro Rosa é o mês que sensibiliza a população no controlo do cancro da mama. O site Crescer juntou os dois temas e conversou com duas mulheres que, de forma diferente, lidam com a menopausa precoce.

Comecemos pela história de Raquel Rocha, que foi diagnosticada com cancro da mama, no ano passado. Mãe de duas filhas, esta mulher começou a ter alguns sintomas diferentes e decidiu ir ao médico. «Sentia há algum tempo que não andava muito bem, andava cansada, sentia o peito endurecido. Tinha acabado de fazer 40 anos e insisti com a minha médica para me passar uma ecografia mamária».

«Explicaram que mesmo não tendo menstruação, podia estar a fazer ovulações»

No entanto, «a médica achava que os sintomas eram por estar a vir a menstruação.»  Mas o que é certo é que, o que não ia ser nada, foi… «Fui diagnosticada com um cancro já avançado e agressivo, o chamado triplo negativo, que não é hormonal porque é negativo para os três tipos de recetores. A doença não responde a tratamentos hormonais (negativo para estrogenio e progesterona) e também não responde aos tratamentos com drogas específicas para o recetor HER2, limitando-se às estratégias mais gerais de tratamento», explica.

Desde que começou a quimioterapia, nunca mais teve menstruação, mas… Há sempre um “mas”… «Disseram que a menstruação podia regressar ou não».

«No IPO encaminharam-me para uma consulta de ginecologia, exatamente por causa do planeamento familiar. Eles explicaram que mesmo não tendo menstruação, podia estar a fazer ovulações, podia não querer dizer que estivesse na menopausa e tinha que ter precauções durante os tratamentos, porque, na verdade, poderia engravidar. Eles não conseguem explicar se é menopausa ou se estou a fazer ovulações», diz.

«Fui encaminhada para uma consulta de planeamento familiar, para ver se podia fazer laqueação e até agora não conseguem dizer se estou na menopausa. Eu tenho sintomas, como os calores, por exemplo», continua.

«Estou naquela fase em que eu quero é estar aqui, com as consequências ou não»

Raquel tem 41 anos e vive numa incógnita. Não sabe se está ou não na menopausa, mas também garante que isso, neste momento, «é o menos importante.» «Não sei se foi por ter passado pelo que passei, mas, sinceramente, esse é o menor dos meus problemas. Claro que digo em brincadeira que “é muito chato ser velha aos 40 anos”… até uso essa expressão quando começo com os calores. Mas não é isso que me incomoda. Estou naquela fase em que eu quero é estar aqui, com as consequências ou não. Estou tão grata por estar cá, que desvalorizo qualquer efeito secundário que tenha vindo daí», garante.

Raquel com as filhas

Raquel tem duas filhas… uma com 12 e outra com sete anos e essa foi a parte mais difícil de todo o processo: a de contar tudo às meninas e de lhes passar uma mensagem de esperança. «Expliquei que estava doente e que me ia tratar. Disse sempre que me ia tratar», continua. E acrescenta: «Desde dezembro que fiz tratamentos e acreditei que ia vencer. Eu acho que passei sempre isso para elas. As minhas filhas nunca me perguntaram se eu ia morrer. Nunca! Para elas a pergunta era sempre quando é que eu ia ficar bem. O foco foi sempre esse! Nunca em casa puseram em causa que algo de mau me acontecesse. Até pensei muitas vezes que se me acontecesse alguma coisa, elas não estariam preparadas, porque não as preparei para esse lado».

Mas faz uma ressalva: «Óbvio que nunca se vão esquecer de ver uma mãe careca e de uma mãe a vomitar. Isto não se esquece. Mas tive um grande suporte familiar, nunca ninguém me deixou sozinha… Os médicos dizem que não estamos curadas, mas o amor cura e eu acredito que estou curada», diz.

Conselhos no que diz respeito à prevenção

«Eu só tinha 40 anos e não tenho nenhum caso na família. Nenhum. Amamentei a minha filha até aos dois anos de idade. Eu não tinha um nódulo, só tinha o peito ligeiramente mais duro e eu insisti muito com a médica para fazer uma ecografia de urgência e acho que se não tivesse insistido, não estava cá a contar a história», começa por explicar.

«Ninguém nos conhece melhor do que nós próprios. O nosso corpo é inteligente e dá-nos sinais. Temos de estar atentos aos sinais e devemos procurar fazer exames. Hoje em dia já há muitas campanhas de prevenção e aproveitem para o fazer. Porque o cancro mata e mata muito, mas também a maior forma de evitar que isso aconteça e que o desfecho seja feliz, é a prevenção. Os maiores casos de sucesso dos diversos tipos de cancro é exatamente o diagnóstico precoce», garante.

«Os testemunhos são muito importantes»

Há um ano, o site Crescer deu a conhecer a história de Micaela Neves, também ela diagnosticada com o mesmo tipo de cancro que Raquel.

«O testemunho dela fez toda a diferença na minha vida, porque o cancro triplo negativo é um cancro raro e eu não conhecia ninguém com este tipo de diagnóstico. E quando estava no período negro em que descobri que estava doente, deparei-me com o testemunho da Micaela no site da Crescer e depois no programa da Júlia», revela.

«Ao ler o testemunho dela pensei: “vai ser igual comigo. Também vou ter um final feliz”. Tanto que a contactei, porque me identifiquei. Eu sou o testemunho vivo, de que os testemunhos fazem diferença. E o dela fez toda a diferença na minha vida», acrescenta.

E Raquel dá um conselho a todas as mulheres que passem pelo mesmo processo que ela. «Acredito que 50 por cento é medicina e 50 por cento somos nós. O acreditar faz toda a diferença. É duro, é. Mas nós somos mais fortes. É bom estarmos cá e temos de lutar. Nas salas do IPO, as pessoas fixam-se sempre, e não sei porquê, no que corre mal, portanto é muito importante existirem estes testemunhos positivos que vocês na Crescer partilham», finaliza.

«Os médicos diziam que não carecia de vigilância»

O caso de Marta Oliveira parece igual ao de Raquel, mas existem diferenças. «Fui diagnosticada com cancro de mama aos 34 anos. Eu sentia uma fisgada no peito. Nunca apalpei nada, nunca houve nenhuma deformação, nem nenhum sinal visível na mama. Eu tinha iniciado a toma da pílula em setembro de 2015 e comecei a sentir, posteriormente a essa toma, uma fisgada. Era quase como se fizesse um circuito até ao mamilo e sentia um ardume e depois passava», começa por explicar.

«Não achava aquilo normal e fui à médica de família. Passou-me ecografia. A 1 de dezembro de 2015 faço a ecografia e dizem-me que é um quisto de 8 milímetros, benigno, que não carecia de vigilância», disse.

Marta antes do diagnóstico

«Acontece que, depois desse exame, talvez por terem andado a carregar e a mexer, isso tenha despoletado uma espécie de inflamação. No início de 2016 começa a crescer de uma forma abrupta. Em maio de 2016 vou à médica e expliquei que me doía e estava a crescer. E a médica disse que não era nada. Relembrei-a do histórico familiar, que tinha tido quatro mulheres com cancro e ela disse: “isto é impossível virar cancro. É um quisto perfeitamente normal” Voltei a dizer que doía muito. Aí recomendou outra ecografia. Tinha crescido para o dobro. Fui novamente ao centro de saúde e pedi biopsia e ela desvalorizou», continua a contar.

«Eu tinha acabado de fazer 34 anos e foi mesmo o correr contra o tempo»

Mas em junho, Marta estava com dores insuportáveis «e aquilo estava enorme.» «A minha médica estava de férias e fui atendida por outro médico, que disse que era hormonal e tinha de deixar de tomar a pílula. Mas eu insisti e pedi biopsia. Ele passou», conta.

«Dia 1 de julho fui fazer a biopsia… sete meses após a primeira ecografia. Não gostei da cara da pessoa que me fez a biopsia. Dia 11 de julho, quando o país parava por causa do Euro 2016, eu recebo a notícia de puxar o tapete. Tinha um carcinoma mamário, de grau 3, agressivo, invasor. Foi assim que eu soube do meu diagnóstico. Já estava no IPO no dia seguinte. Eu tinha acabado de fazer 34 anos e foi mesmo o correr contra o tempo», relembra.

«Nunca me dei por vencida porque eu sou uma mulher de garra»

Marta é mãe de uma menina, hoje com dez anos. «Foi o começar a refletir sobre tudo. Pensar na minha filha, em como ia explicar-lhe isso. Tivemos de arranjar uma forma de suavizar as coisas. Encontrei um livro na Laço, que é espetacular a forma de explicar a uma criança o que é o cancro e o cancro da mama. Dei à minha filha e ela ia seguindo o que me acontecia pelo livro. Fomos levando muito na “brincadeira”. Nunca me dei por vencida porque eu sou uma mulher de garra. E sempre pensei: “se as outras conseguem, eu também vou conseguir” Foi a agarrar-me a tudo!», garante.

Marta com a filha

Sendo, na altura, mãe de uma menina de sete anos, e tendo ela apenas 34, Marta garantiu que gostava de voltar a ser mãe. «Nas primeiras consultas no IPO, a primeira médica que me viu perguntou se queria ter mais filhos e aconselharam a fazer criopreservação dos ovócitos. O Serviço Nacional de Saúde comparticipa na retirada dos ovócitos, mas a medicação, o tratamento em si, temos de ser nós a suportar. Explicou que se fosse infértil teria direito até três tratamentos gratuitos, mas isto era um dano colateral de uma doença, ou seja, isto era uma escolha minha – a de ter mais filhos. E eu disse que queria, mas a médica disse para fazer da criopreservação, só depois da operação, isto porque o meu cancro era hormonal. As injeções  fazem com que haja um disparo a nível hormonal e o meu cancro se era hormonal, as injeções só iriam fazer crescer o bicho», explica.

«A cada três dias eu deixava mais de 200 euros na farmácia»

Então, na operação, retirou os nódulos e depois do tratamento, tratou da questão da criopreservação. «Fiz um tratamento de 18 dias… a cada três dias eu deixava mais de 200 euros na farmácia. Ia buscar as injeções e pagava esse valor. Gastei uma “pipa de massa”. Eu nem sabia no que me ia meter, porque custa imenso. Explicaram-me tudo, mas não sabia que ia custar tanto. Parecia que tinha vidros dentro de mim. Eu não sabia como funcionava, porque nunca foi tema do meu interesse. Eu não sabia que era uma agulha que me ia furar a parede vaginal até aos ovários para me tirarem os ovócitos de lá… fui furada 18 vezes… o “pós injeções” dói», garante.

Marta durante a quimioterapia

Depois fez seis sessões de quimioterapia, depois radioterapia, depois braquiterapia e desde a quimioterapia, que fazia uma série de tratamentos que foram contínuos. «Mais ou menos três meses depois da quimioterapia, voltei a ser menstruada e foi aí que a médica me disse que tenho de ficar na menopausa induzida. Teria de fazer ainda outro tratamento para me manter na menopausa», recorda.

«Como o meu cancro era hormonodependente eu teria de usar um diu de cobre porque não podia ser hormonal e teria de me manter na menopausa. Eu não poderia ter produção hormonal, ser menstruada, porque era um risco para o meu tratamento», continua.

Mas… então o porquê da criopreservação?

«Somei 1 + 1 e perguntei o porquê de ter feito a criopreservação dos ovócitos. Estão-me a dizer que se for menstruada, corro o risco da doença voltar», relembra.

«A minha médica oncológica diz que estou a ser muito egoísta porque um capricho pode pôr a minha vida em risco. Mas é a opinião dela. É uma coisa que vai ficar em stand-by. Claro que sinto uma revolta enorme, porque fiz a criopreservação… Sinto-me revoltada, não só pelo dinheiro, mas acima de tudo pelo esforço físico das injeções. E agora? Fiz uma criopreservação que não me serve de nada. A não ser futuramente para alugar uma barriga, porque senão… foi para nada», diz, revoltada.

E quais os sintomas da menopausa induzida?

Marta está na menopausa, que foi induzida para sua proteção. E os sintomas não têm sido fáceis. «Calores, a dores terríveis nos ossos e articulações. É terrível. Envelhecemos. Nota-se drasticamente que ficamos mais frágeis e cansamo-nos com uma facilidade enorme, mas isso eles não conseguem separar se é dos tratamentos contra o cancro, se é da menopausa induzida. Engordamos imenso, porque o nosso metabolismo fica quase parado. Tudo mexe com o psicológico. Desde que descobri o cancro, até agora, tenho cerca de mais 20 quilos. Já perdi 10, mas ainda faltam mais 10, o que é muito difícil, porque estamos numa menopausa induzida e o nosso corpo reage de diferente de mulher para mulher», reage.

Marta depois da quimioterapia

Mas a revolta de não poder voltar a ser mãe, embora tenha feito a criopreservação dos ovócitos, essa… Ninguém lha tira. «Quebraram-me um sonho. Sinto-me injustiçada a nível familiar, a nível económico. O Estado não me ofereceu nada. Fui eu que paguei. Devia ter havido uma melhor comunicação entre profissionais. Isto podia ter sido tudo evitado.»

Conselhos a todos os homens e mulheres que passem pelo cancro

Marta não quis perder a oportunidade de dar uma palavra a todos os que passem pelo diagnóstico do cancro. «Nunca deixem de acreditar. A nossa forma de encarar a doença, é meio tratamento feito. A primeira médica do IPO dissE: “Tem noção que metade do seu tratamento está feito… Só a forma como vocês está a encarar as coisas…” Eu só queria viver e estar com a minha filha.»

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