Há quem diga que a adolescência é das fases mais difíceis dos filhos e são muitos os pais que desesperam. A psicóloga Andreia Ferreira, do projeto Fale Connosco – Saúde Personalizada, ajuda-o a perceber como lidar com um adolescente.
Leia com atenção o seu texto:
Na adolescência é muito comum assistirmos a drásticas mudanças de comportamento, de repente os filhos já não querem passar tempo com a família, só querem saber dos amigos, isolam-se no seu quarto, começam a dar ‘respostas tortas’, entre muitos outros comportamentos… Calma, é normal, é uma fase (daquelas bem exigentes!) e vai passar!
Mas o que é a adolescência?
A adolescência é um processo de autonomização, é uma fase de descoberta, de descoberta da sua identidade e do lugar que ocupa no seio das várias relações que vai construindo. No decorrer deste processo o adolescente procura desenvolver-se como um ser psicologicamente separado dos seus pais e o apoio dos mesmos torna-se essencial para que o adolescente possa atravessar esta fase – que já por si é conflituosa – com o menor conflito psíquico possível.
Laços “apertados” ou “desapertados”?
O processo de formação de identidade é central na adolescência e vai decorrendo ao longo de várias fases, sendo a procura de identificações uma fase central para que, mais tarde, o adolescente se possa encontrar a si mesmo. Estas identificações podem ser vistas como peças de um puzzle, peças que o adolescente deverá ir não somente juntando, mas também alterando, de forma a que possa construir uma imagem coesa de si mesmo.
A identidade deve ser olhada como um processo de desenvolvimento no qual o sujeito irá desenvolver o seu próprio sentido do mundo e, por isso, a passagem da infância para a adolescência e posteriormente, da adolescência para a fase adulta, será um processo de re-significação das estruturas e informações previamente existentes (Erikson, 1968).
LEIA TAMBÉM: Circuncisão: Todas as respostas às perguntas dos adolescentes!
Podemos, então, compreender que as relações são o principio fundador da identidade (Hollway, 2010) e, como tal, o outro surge na adolescência com uma importância fundamental. Com a necessidade do adolescente de se começar a autonomizar e desenvolver-se separadamente do seu seio familiar, os amigos começam a ganhar um novo peso na sua vida.
Será na relação com os seus pares que o adolescente se pode ir identificando com os seus semelhantes e, simultaneamente, diferenciando das suas figuras parentais de forma a que, mais tarde, se possa voltar a relacionar com os mesmos de forma mais adulta e com a sua identidade definida. Para que este processo se possa desenvolver, os laços afectivos que unem o adolescente aos pais devem ser suficientemente desapertados para que esteja garantida a livre escolha de outras relações e para que o adolescente se possa reorientar para relações com outros sujeitos da sua própria geração, o que irá conduzir a uma integração normal numa realidade social adulta (Jacobson, 1996).
O desafio de deixar voar…
Claro que todo este processo é conflitual para o adolescente, principalmente porque obriga a um abandono da sua dependência emocional dos pais. Existem diversas alterações que vão ocorrendo neste processo: o corpo em mudança, a indefinição de si próprio, o facto de não se identificar como criança mas também ainda não se reconhecer como adulto, as relações com o outro diferente que se vão desenvolvendo e que, tal como já vimos, são tão importantes… E como para qualquer um de nós, a mudança e o desconhecido podem ser assustadores!
LEIA AINDA: Como ensinar os filhos adolescentes a usar as lâminas de barbear ou de depilar
Por isso, é necessário que os pais estejam atentos, que consigam definir os “limites do aceitável” para que possam identificar comportamentos de risco quando estes surgem e, simultaneamente, para que possam compreender o seu adolescente, para que possam validar aquilo que sente, para que possam estar presentes quando necessário mas, ao mesmo tempo, para que lhe possam, também, dar espaço para que se desenvolva ao longo deste processo porque a verdade é que se não lhe abrirem a janela para que possa voar, as asas que lhe ofereceram em tempos não vão ter utilidade.
O psicólogo também pode ajudar
Erikson (1968) desenvolveu o termo ‘crise adolescente’ para se referir a este ponto de viragem crucial em que o adolescente procurará integrar ou reintegrar características anteriores numa nova estrutura de personalidade coerente, no entanto, é importante que os pais e que os adolescentes saibam que podem recorrer à ajuda de um profissional para ultrapassar esta crise adolescente da forma menos crítica possível, apoiando o adolescente para que este possa desenvolver estratégias adaptativas para lidar com todas as alterações que decorrem neste processo, bem como ajudarem-no a compreender e dar um significado ao que sentem. Simultaneamente, podem surgir como suporte para os pais, para que possam apoiá-los a eles também, pois sabemos que este período não é apenas difícil para o adolescente, é um enorme desafio para os pais, mas que pode e deve ser ultrapassado com sucesso.
A reter:
A adolescência é um processo de mudança, tanto para o adolescente, como para toda a estrutura familiar e, como tal, traz novos desafios.
Os amigos ganham um papel de relevo ao longo de todo este processo pois é através da relação com os pares que o adolescente pode ir desenvolvendo identificações com os seus semelhantes de forma a poder construir uma imagem coesa de si próprio.
As figuras parentais deverão surgir como facilitadores de todo este processo, promovendo a autonomia do adolescente e, simultaneamente, compreendendo e acolhendo as dificuldades naturais pelas quais este vai passando no decorrer desta fase.
O psicólogo poderá surgir como um suporte não só para o adolescente, mas também para a família, ajudando-os a ultrapassar esta fase com a maior tranquilidade possível.
Texto: Psicóloga Andreia Ferreira, Fale Connosco – Saúde Personalizada (acompanhamentos terapêuticos 100 por cento personalizados na zona da Grande Lisboa em todas as faixas etárias nas especialidades de terapia da fala, psicologia e terapia ocupacional. Atuação também na área da formação e bem-estar, nomeadamente neurocoaching)