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A polémica lei de igualdade de género: «Não sabe o que é viver no corpo errado»

Redação
publicado há 5 anos
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Rita Alves é mãe de Leonor, uma menina transexual. A polémica lei que estabelece direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e à proteção das características sexuais de cada pessoa está a dar muito que falar. Esta terça-feira, 20 de agosto, o Observador publicou um artigo de opinião de Laurinda Alves intitulado “Minorias de Estimação”. O texto criou alguma revolta e levou esta mãe a publicar nas redes sociais a sua opinião.

Palavras emotivas que expressam bem a dor de uma mãe perante uma situação inesperada e que demonstram a dura realidade das crianças que nascem no corpo errado.

LEIA TAMBÉM: Pais defendem despacho sobre identidade de género nas escolas

Leia aqui a carta de Rita Alves dirigida a Laurinda Alves:

Já houve tempos em que achava graça ao que escrevia. Foram passando e hoje passaram de vez.
Explico já o que motiva a minha carta e o porquê de ser aberta. Assim, se quiser, pode pô-la já de parte.

Chamo-me Rita e sou mãe da Leonor. A Leonor é transexual. Ela existe. É a minha filha, por muito que, para si, ela seja uma “minoria de estimação”, para si um mero trocadilho com “animal de estimação”.

A Laurinda Alves nem sonha, nem imagina o que vivem estas crianças e as suas famílias. Está tão longe do seu mundo de anjinhos e coisas fofas que, percebo bem, a sua única via é falar do que não sabe e discorrer sobre casas de banho nas escolas.

Não sabe o que é viver no corpo errado. Não sabe o que é ser mãe e ter um filho que logo aos três anos diz a chorar que não é menino, que não percebe porque insistimos em tratá-lo por menino. Não sabe que os punimos por isso, que os repreendemos e que rejeitamos. Porque nós, pais, tal como a Laurinda Alves, não sabíamos o que era. Para nós, tal como para si, o nosso querido filho era afinal o quê? Um deficiente? Uma aberração?

Aprender a amar é tão duro quanto isto. Voltar a amar aquele que rejeitámos. Sabe o que é o peso de nós, pais, termos contribuído para a rejeição?

E sabe como é ir para a escola? Onde os professores, coitados, têm de lidar com uma situação também para eles completamente nova e para a qual não têm qualquer formação? Sabe o que é ir ver as notas da sua filha e a pauta ter o nome em branco, como se não existisse, porque era, até agora, a única forma legal de não usar o nome que já não usávamos? Sabe o que é ter uma filha em pânico por não saber se pode ir a uma casa de banho, por ter de se despir em frente a outros? Sabe o que é tê-la no colo a chorar e a perguntar porque é que nasceu assim e angustiada por viver a solidão mais profunda? Não sabe nada disto. Não tem como saber porque não terá nenhum filho trans. Não viveu. Viveu apenas a vida da mãe dos filhos privilegiados que cabiam na norma da maioria.

E é tão confortável viver como a maioria. Até permite falar das “minorias de estimação“.

Ao contrário do que diz, havia e há legislação para as crianças deficientes e até houve uma escola onde a minha filha só encontrava privacidade na sala dos autistas. Digno, não é? Mas para si os autistas são uma minoria que vale a pena. A minha filha, para si, não merece a atenção do governo, que só peca por tardia.

Não vou descrever tudo pelo que a Leonor passou por olhares como o seu. É e será sempre um olhar cheio de preconceito e de certezas. Que sorte que tem! Os pais de uma criança trans nunca têm certeza nenhuma. Mas a senhora está cheia de certezas. Parabéns! Acredite que é mesmo uma felizarda.

(…)

Se a minha filha tivesse leucemia, talvez chorasse a sua lágrima e comesse o seu croquete solidário. Como é trans, tem de ser escondida e o estado tem de fazer de conta que ela não existe. É assim a espiritualidade e a humanidade das Laurindinhas.

Sabe o que me anima, Laurinda Alves? São os jovens. A felicidade da minha filha tem sido assegurada pelos amigos e amigas que a têm apoiado e ajudado, tantas vezes contra adultos que pensam como a Laurinda.

Parabéns por ter escrito. É a prova de tudo o que está por fazer.

Rezo por si. E sabe porque o faço? Porque a Laurinda, tal como a minha filha, não é para mim uma aberração, mas alguém perturbado e que precisa de apoio.

Leia aqui a carta na íntegra:

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