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Os brinquedos não têm sexo

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publicado há 8 anos
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Está quase na hora dos pais começarem a entrar pela porta do infantário para irem buscar as suas crianças. O Gabriel veio ter comigo e pediu-me para lhe colocar o vestido de princesa rosa. Assim fiz a sua vontade. Rodopiava com o vestido e ria muito. Na secção do «social corner», pegou ao colo um nenuco, embalando-o gentilmente.

Da porta, ouvi uma voz masculina dizendo:

– «Mas o que é isso? Porque é que o meu filho está vestido de menina e com uma boneca ao colo?»

A sua voz vinha carregada de masculinidade agressiva e assustada. Mandou o filho despir-se, jogou o nenuco para o lado e pediu satisfações à líder de equipa. Decidiu fazer queixa. Achou que estávamos a incentivar à modificação da identidade do Gabriel.

Eu não sou mãe, não sou psicóloga e muito menos sou uma expert. Sou apenas uma educadora de infância e uma assistente de festas infantis.

Quem trabalha com crianças sabe bem que no PSED (desenvolvimento pessoal, social e emocional) brincar com nenucos/bonecas faz desenvolver o senso de preocupação com os outros, a importância das práticas de hábitos, higiene e cuidados para consigo próprio e para com os outros. Desenvolve a capacidade de entender a influência que pode ter nos outros, e os outros para consigo. Suscita a curiosidade para os processos de relações interpessoais e ainda desenvolve autoconfiança.

Não é pelo facto de um menino brincar com bonecas e uma menina brincar com carros que se vai distorcer a sua identidade. Sempre se agrupou os brinquedos, de forma a dividir os sexos. Brinquedos não têm sexo. O chamado role-play, onde as crianças podem escolher a roupa, ou o disfarce que querem usar, não vai determinar as suas opções sexuais no futuro. Nós, adultos, tratamos logo de pôr rótulos em crianças e somos nós adultos, que acabamos por acreditar tanto nesses rótulos e lhes damos vida, reforçando o preconceito.

É preciso dar liberdade à criança… para ser criança. Para brincar. Para explorar.

O medo que vi nos olhos desse pai assustou-me até a mim. Este tema tem de deixar de ser tabu. É preciso que se olhe para as coisas de outra forma. Um menino brinca com boneca, brinca de cabeleireiro? Está a brincar, ponto. A menina brinca com carros, gosta de jogar à bola? Está a brincar, ponto.

Os brinquedos não são feitos para determinar a sexualidade. Os brinquedos servem para desenvolver a capacidade de perceção, de criatividade e observação.

Os pais devem fazer as crianças entenderem a diferença entre masculino e feminino, mas não passar a imagem de insegurança, de medo e de repugnância. É importante que os pais saibam respeitar as escolhas das crianças e as percebam, sem julgar. As crianças não sabem do que nós adultos já estamos imaginando, nem têm essa clara noção que a sociedade os julga por terem que escolher os brinquedos, de acordo com o que a sociedade entende ser o certo.

Não ensine aos seus filhos o preconceito em relação aquilo que é diferente. Os brinquedos não têm sexo. As crianças brincam porque querem explorar. O seu filho não se tornará num homossexual por brincar com nenucos. O seu filho vai aprender a cuidar do próximo, a tornar-se uma pessoa mais tolerante e respeitar os outros. O seu filho não se tornará num homossexual por vestir um vestido. Ele desenvolve a sua criatividade e imaginação, o seu poder de imitação, quem sabe descobre o seu gosto por dança ou teatro através dos vestidos.

Uma menina também não se tornará homossexual por jogar à bola. As suas capacidades físicas desenvolvem-se, o gosto pelo desporto também.

Sejamos mais mente aberta e deixemos as crianças serem crianças. Explorar, brincar e acima de tudo, serem felizes!

 

 

 

Texto: Sandra Silva (Facebook e Instagram)

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